[Alex Atala durante uma demonstração, em Lisboa, apresentado as raízes da priprioca (©mesa marcada); abaixo: close das raízes (foto com direitos reservados)] |
Não faz tanto tempo assim, por conta de viagens ainda recentes a Goiás e Pará — de que vou dando conta neste blog em diferentes posts —, tive oportunidade de provar, pela primeira vez, vários frutos e ingredientes amazônicos que, aos poucos, estão não só conquistando o resto do Brasil, mas também atraindo a curiosidade do mundo inteiro. De todo o modo, eu considero que minha estréia pra valer, nessa matéria, deu-se numa passagem, dois anos atrás, pelo Maranhão, para muitos uma espécie de pré-Amazônia, onde fiquei, por exemplo, conhecendo o bacuri (polpa branca e sabor bem intenso).
Nem sempre é muito justo destacar apenas um nome quando os contributos, válidos para mais, chegam de muitos lados, mas ninguém levará a mal se eu disser que o chef Alex Atala, mais do que todos os outros, tem desempenhado, dentro mas sobretudo fora do país, um papel fundamental em todo este processo de levantamento, experimentação e divulgação do potencial amazônico a favor da cozinha contemporânea brasileira.
Por isso, e porque a elevação do D.O.M à sétima posição no ranking dos 50 melhores restaurante do mundo em 2011 segundo a revista Restaurant o colocou ainda mais — se é que é possível — na mira mundial, não admira que The New York Times, num guia recente sobre a cidade de São Paulo, tenha feito menção em sua resenha ao sorvete de cagaita servido no restaurante. O fato não passou desapercebido e está abrindo caminho para que entendidos juntem agora à conversa outros nomes improváveis como maturi (que provei numa deliciosa moqueca do chef Beto Pimentel, em Salvador), licuri (na foto, ainda no pé da palmeira), achachairu ou priprioca, só para citar alguns.
[Maturis no pé, ou seja castanhas de caju verdes (foto com direitos reservados)] |
Muitos brasileiros não conhecem a cagaita — pude comprová-lo quando, deliciado pela descoberta desse sabor através dos sorvetes goianos Frutos do Cerrado, falei a vários amigos e a maioria ficou à toa —, o que dirão os gringos para quem uma pitanga ou uma acerola já são para lá de exóticas.
[Uma cagaita madura, pouco maior do que a moeda de R$1 (foto com direitos reservados)] |
Como sempre digo, uma coisa leva a outra. O Brasil está na ordem no dia, mas não é só sua economia que está emergente. Nunca como agora a cozinha brasileira, muito por conta do trabalho de regaste dos ingredientes regionais desenvolvido por Atala e por outros virtuosos como Ana Beatriz Trajano (do Brasil a Gosto) ou Mara Salles (do Tordesilhas), despertou tamanho entusiasmo. Uma prova? Será um dos países-tema, juntamente com o México e o Peru, do Gastronomika, um importante congresso gastronômico do País Basco espanhol, agendado para o próximo mês de Novembro e no qual prevê-se a presença de vários chefs-top do Brasil.
Que a pretexto de tudo isto que está acontecendo, sejam cada vez mais os brasileiros (e não só) tentados a saber mais sobre seus produtos. Como português, reconheço na herança que deixámos aos brasileiros essa tendência para buscar sempre a aprovação de fora e para, muitas vezes, só darmos valor ao que é nosso quando os outros aprovam.
Mais do que apenas saber reconhecer a cagaita, ideal para sucos e sorvetes, importa também descobrir que sua árvore ostenta uma belíssima floração branca (como flocos de algodão) nos meses de Agosto e Setembro, enfeitando a paisagem do cerrado brasileiro. Ou que a priprioca, mais uma planta amazônica de cujas raízes extrai-se um potente aroma idêntico ao patchouli, é um agente aromatizador que está fazendo furor e que Alex Atala, sempre ele, não se cansa de divulgar fora do Brasil — ainda em Maio fez questão de apresentar a raiz num evento gastronómico em Lisboa que tinha o peixe por principal mote.
[Pudim de leite, ravióli de limão e banana ouro, uma das sobremesas de Atala que levam o aroma de priprioca (foto com direitos reservados)] |
Sobre a priprioca, que pode ser encontrada em algumas barraquinhas especializadas de São Paulo, importa dizer que seu aroma, como Atala admite, também lembra um pouco a maconha, mas na cozinha, sobretudo em sobremesas, ela faz as vezes da baunilha. Ou seja, uma tremenda viagem sensorial.
Sem comentários:
Enviar um comentário