4.10.11

#gastronomia: vii festival da alcachofra em santo antônio do pinhal (SP), até dia 02.11

[A sala e a vista do restaurante Donna Pinha, em Santo Antônio do Pinhal (©luna garcia, todos os direitos reservados); e close das alcachofras (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Campos do Jordão que me perdõe, mas eu sou mais Santo Antônio do Pinhal.

A cerca de duas de carro de São Paulo, Santo Antônio do Pinhal, em plena serra da Mantiqueira, não vive mais na sombra de Campos do Jordão e vem engrossando, de ano para ano, seu quinhão de admiradores fiéis. 

Na prática, apenas 29 quilômetros separam as duas, mas são mundos e propostas diferentes para curtir o mesmo cenário de montanha. Com a diferença de que Campos se deixou embalar pelo agito e mundanidade e Santo Antônio, ainda que com uma infra-estrutura de lazer crescente (contam-se, pelo menos, três pousadas novas), mantém seu apelo de roça e insiste num contato mais direto com a Natureza.

Se isto não fosse motivo já mais do que suficiente para passar ali um final de semana, o VII Festival da Alcachofra, que decorre até 2 de Novembro, me proporcionou a desculpa que faltava para fugir de São Paulo por dois dias.

[Plantação orgânica de alcachofras, variedade Roxa de São Roque, em Santo Antônio do Pinhal (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Na verdade, a matéria-prima para o festival vem dali mesmo, de Santo Antônio do Pinhal. Entre os produtores locais, tive oportunidade de visitar o sítio de Roberto e Helô Lisboa, naturais de São Paulo, que realizam a cultura da Alcachofra Roxa de São Roque (a variedade mais plantada no Brasil) de forma orgânica e são os principais fornecedores dos restaurantes participantes.
[No sítio da família Lisboa, em Santo Antônio do Pinhal, além das culturas orgânicas como a da alcachofra há também outros atrativos como o cachorro Zappa, um boiadeiro australiano (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

É nesta época do ano, na Primavera, que as culturas de alcachofra estão em seu máximo esplendor, pelo que o festival é também um excelente pretexto para visitar as plantações com os botões em flor e, com alguma sorte, assistir à sua colheita.

[Chef Anouk Vasconcelos Rosa fotografada no Donna Pinha, em Santo Antônio do Pinhal (©luna garcia, todos os direitos reservados)]

Mas se a estrela é a alcachofra, o mérito, esse, é todo da chef Anouk Vasconcelos Rosa, que, pelo sétimo ano, bolou o festival. Formada em gastronomia pelo SENAC, Anouk assume o fogão, mas se revela também totalmente à vontade no papel de anfitriã. No salão, seu humor afiado não passa desapercebido e garante, desde a primeira hora, uma empatia toda especial. 

Dividida entre o vício da corrida (corre, de segunda a sexta, três quilômetros por dia faça chuva ou sol) e a gestão dos negócios e de uma família numerosa com quatro crianças e muitos mais bichos, Anouk cozinha desde garota (influenciada pelos pais, de origem francesa), mas só há cerca de oito anos entrou no mundo da restauração para valer. E o que lhe falta, por vezes, em aprumo técnico, sobra-lhe em disposição, empreendedorismo e criatividade.

[Vista do Donna Pinha para o Jardim dos Pinhais, na serra da Mantiqueira (©joão miguel simões); Casquinha de Truta Defumada em Flor de Alcachofra (©luna garcia); interior aconchegante do Donna Pinha (©luna garcia); Fettuccine com Molho Bechamel e Cogumelos na Flor de Alcachofra (©joão miguel simões)]

À frente de dois restaurantes em Santo Antônio do Pinhal, a chef Anouk fez questão de dividir o festival pelas duas casas. Começo pelo primogênito, o Donna Pinha. À entrada do Jardim dos Pinhais Ecco Parque, projetado pelo arquiteto Manoel Carlos de Carvalho e considerado um dos principais parques temáticos do Brasil, o restaurante faz a linha rústico-contemporâneo e oferece de bandeja — quer no deck, quer no interior rasgado por enormes janelões — um panorama soberbo da serra. A vista adentra o salão, equipado com lareira para os dias e noites mais frios, sem pedir licença e faz parte do regalo de comer ali.

[No sentido horário: Alcachofra ao Vinagrete; Truta com Damasco e Fundo de Alcachofra;  Penne ao Creme de Alcachofra; Alcachofra Gratinada ao Gorgonzola (©luna garcia, todos os direitos reservados)]

São cerca de 10 os pratos, entre entradas, massas, risottos (usando as variedades locais de arroz vermelho e negro) peixes e carnes, criados pela chef para assinalar o festival e em todos eles, como não podia deixar de ser, a alcachofra está sempre (mais ou menos) presente. Dos que tive a oportunidade de degustar, ao longo de dois dias em regime de maratona gourmet, elejo como meus preferidos a Casquinha de Truta Defumada em Flor de Alcachofra (R$10,80), servida como entrada, e o Fettuccine com Molho Bechamel e cinco tipos diferentes de cogumelos (todos colhidos localmente), servidos no interior da flor da alcachofra (R$35,80).

[Na sala interior do Santa Truta, cores alegres e panos floridos de chita se harmonizam com o entorno rústico (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Aberto apenas há quatro meses, o Santa Truta, também em Santo Antônio, é a segunda casa comandada por Anouk, em parceria com seu companheiro, o empresário Luiz Manoel (o casal possui ainda um negócio local, com fábrica e loja, de couros, tricots e jeans). Em zona protegida da serra, a obra não tem sido fácil, mas, aos poucos, o restaurante ultima os preparativos e ganha uma clientela fiel entre a comunidade japonesa residente em São Paulo.

[No exterior, em contato com a Natureza, mesas e cadeiras de madeira de demolição fazem jus ao espírito de sustentabilidade do Santa Truta (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Enquanto decorrer o VII Festival da Alcachofra, o cardápio do Santa Truta vai igualmente apresentar os pratos concebidos para o evento, mas quem ali for em busca de seus carros-chefe, como a deliciosa Truta à Brasileira — fresca e grelhada, servida inteira com puré de mandioquinha, é, sem dúvida, uma das criações mais bem conseguidas de Anouk, entre todas as que pude degustar no final de semana — ou os vários tipos de fondues, não vai sair defraudado

Inspirado pelo entorno bucôlico, o Santa Truta, que possui um riacho e uma capela que fazia parte do caminho de peregrinação até à Aparecida, usa tijolos e madeira de demolição no exterior. Anouk, que se encanta ao falar dos tucanos, dos esquilos ou dos pica-paus que visitam a propriedade, mostra a horta, de onde, a seu tempo, sairão produtos típicos da roça, como as ervas lambari e a serralha, que serão depois servidos no restaurante.

[A chef Anouk prepara uma de suas especialidades prediletas: a lingüiça de truta, servida na  pedra (©luna garcia, todos os direitos reservados); sobremesa de atemóia e couvert de geléias e picles (©joão miguel simões, todos os direitos resevados)]

Ao longo do ano, Anouk vai realizar mais de cinco festivais gastronômicos temáticos em seus dois restaurantes, de forma a tirar o melhor proveito dos produtos sazonais. Fora isso, cada uma das casas possui uma ementa de base que respeita o paladar mais conservador de seu público, mas, ainda assim, arriscam pequenas inovações na forma e na apresentação — neste momento, por exemplo, a chef está focada em usar cada vez mais flores comestíveis em seus pratos.

"A pior coisa que me pode acontecer é chegar um daqueles clientes habituais, que vem com toda a família no final da semana, e me falar: Anouk, o prato que eu queria é precisamente aquele que você tirou da carta!", confidencia a chef com seu jeito levado. 


Por essas e outras, especialidades como a lingüiça de truta defumada na pedra (R$28, com molhos de queijo Roquefort e de chimichurri), servida no Santa Truta, ou o couvert com pães caseiros e uma seleção de geléias, patês e picles (R$9,80 por pessoa, destaque para a novidade de limão-cravo e abobrinha), servido no Donna Pinha, são já "clássicos". Nas sobremesas, Anouk adora criar em cima das frutas da época — como a atemóia (híbrido semelhante à fruta-conde) ou as amoras e mirtilos —, que serve sob a forma de mousses ou em taças com suspiros.

[Santo Antônio está repleta de artesãos, produtores rurais e artistas plásticos, mas as cachaças da Bodega são uma atração à parte a que muitos poucos visitantes resistem (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Mas nem tudo se resume aos restaurantes. Anfitriões de Santo Antônio do Pinhal, o casal Vasconcelos Rosa é o primeiro a nos fornecer dicas sobre o que ver e fazer à volta. 

Feiras de produtos locais orgânicos, ateliês de artistas plásticos e artesãos, o Jardim dos Pinhais (são 1200 metros de passarelas para percorrer, ao longo de oito projetos ornamentais, espécies botânicas de diferentes países), as caminhadas na Pedra do Baú ou até a realização de voo livre no Pico Agudo são apenas alguns dos extras que completam a oferta de lazer em Santo Antônio do Pinhal.

Sem tempo para tudo, infelizmente, não arredei pé sem passar pelo menos na Bodega (acesso pelo km 5 da Estrada do Machadinho, tel. 012 3666-1326, abre aos sáb. e dom., entre as 10.00 e as 16.00). O nome em espanhol nos remete para uma adega, mas, no caso, se trata mesmo é de uma cachaçaria tradicional, com alambique e produção própria. Quem chega tem pela frente, se assim o entender é claro, a dura tarefa de degustar até 45 sabores diferentes de cachaças doces ou secas, expostas em grandes garrafões de vidro transparente. 

Consta que as de figo e cambuci são as campeãs de vendas. Provei as duas e não resisti à primeira, nem a uma outra, de mel e canela. O litro fica a R$12, engarrafado na hora, mas também é possível optar por garrafas menores, em formato long neck, que saem por R$5 cada. Quem quiser, poderá ainda se abastecer de doces e geléias caseiros, além de harmonizar a pinga com salame de javali, picanha, filé-mignon ou lombo suíno.

E já que estou embalado no assunto, vale ainda a pena referir, sobretudo agora que as cervejas artesanais roubam a cena no Brasil, as variedades produzidas pela Baden Baden, fábrica da vizinha Campos do Jordão. Degustei a Cristal, tipo pilsen, e a Golden, tipo ale. Robusta, esta última, à base de trigo com canela e frutas vermelhas, se revelou uma acompanhante e tanto para as sobremesas de frutas (dizem que vai igualmente bem com frutos do mar e queijos como o Gruyère ou o Gouda).

Depois de tanta comilança boa, é bem provável que no regresso a casa o peso extra não seja apenas das iguarias e das recordações compradas... Mas, dias não são dias, certo?

Donna Pinha | Estrada de Santo Antônio do Pinhal, tel. (012) 3666-1233
Santa Truta | Av. Antônio Joaquim de Oliveira, 647, Centro, Santo Antônio do Pinhal, tel. (012) 3666-2764

5 comentários:

  1. Estivemos em SAdP duas vezes, há anos. Vale muito a visita, gostamos bem mais que Campos do Jordão (e, numa necessidade/vontade, basta dar um pulinho à cidade vizinha)!

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  2. Muito boa matéria. É Santo Antonio do Pinhal ganhando o merecido reconhecimento. Já compartilhei no facebook. Edith

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  3. Santo Antônio do Pinhal está de parabéns!
    Uma bela cidade com muitos atrativos (incluindo o tour gastronômico) interessantes e invejáveis ;-)

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